PADRE CÍCERO E O BEATO
O jornalista e historiador Eliézer Rodrigues me remete à história do Cariri quando posta em rede social uma pequena escultura do Beato Zé Lourenço, protagonista dos episódios que culminaram com a extinção do projeto comunitário do Sítio Caldeirão. Eliézer diz que o Padre Cícero abandonou o beato na hora da crise com o Estado. O problema do Caldeirão em relação ao padre Cícero foi o Boi Mansinho, que se transformou em ícone da religiosidade popular, uma heresia para a Igreja. O Padre Cícero, fiel aos preceitos fundamentais do Catolicismo, não poderia jamais aprovar o desvio do fanatismo criado em torno do Boi que, segundo dizem foi um presente de Delmiro Gouveia ao padre que, por sua vez, presenteou o Beato. Floro Bartolomeu mandou matar o boi. Junte-se a esses exageros da religiosidade da população ignara os aspectos jungidos a interesses políticos contrários ao modo de vida comunitário dos habitantes do Caldeirão. Temiam os governantes que aquela comunidade se transformasse em uma segunda Canudos.
DIES DOMINI

Domingo, Dia do Senhor, dia para a oração, a reflexão, o jejum. São João Paulo II escreveu Carta Apostólica subordinada a essa expressão, na qual estimula os cristãos católicos a redescobrirem o significado místico do Dia do Senhor, em razão da memória da ressurreição. Com efeito, o povo cristão dá muita ênfase à paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo e parece deixar a ressurreição em segundo plano na soteriologia. Predomina entre nós uma Teologia da Cruz, pouco de Teologia da Ressurreição. Mas, o apóstolo Paulo, que tanto exaltou a dialética da crucificação, é o mesmo que sentencia: “Se Cristo não ressuscitou é vã a nossa fé.” Lembre-se que o “Dies Domini” guardados por judeus e adventistas é o Sábado; para os muçulmanos, a sextas-feira é o dia sagrado, consoante determina a Sunna do Profeta Maomé.
TROVANDO
A trova é gênero poético de difícil elaboração, uma vez que o autor deve condensar em quatro versos septessilábicos toda a ideia que fulge em sua imaginação criadora. Disse-o bem sobre o tema o poeta Adelmar Tavares, “pai” do trovismo brasileiro:
Oh, linda trova perfeita,
Que nos dá tanto prazer!
– Tão fácil depois de feita,
Tão difícil, de fazer…
Há trovas clássicas e populares. Em ambas as categorias descobrimos verdadeiras jóias da Poesia. Do cancioneiro popular português recolho esta antológica trova, de notável conteúdo filosófico e teológico, que expressa de forma extraordinária o mistério da encarnação do Filho de Deus no ventre da Santa Virgem:
No seio da Virgem Pura
Pousou a divina graça,
Entrou e passou por ela
Como o sol pela vidraça.
O escritor Agerson Ferro, em livro intitulado O DEDO DE DEUS, de 1904, diz, equivocadamente, ser essa bela trova do cancioneiro cearense.
ANTOLOGIA
No anos 1980 pertenci à secção cearense da União Brasileira de Trovadores, cujo presidente era o poeta e cinéfilo Fernando Câncio de Araújo. Cometi algumas trovas. A escritora Nenzinha Galeno inseriu uns poucas na Antologia da Trova Cearense, obra que ela organizou em 1987. Transcrevo:
Esta trova que ora canto
Não é filha da razão,
É o rebento do pranto
Nascido do coração.
Neste rastro de saudade
Que o meu cantar vai deixando,
Eu sinto a intensidade
Do mal de viver sonhando.
Quando no funéreo chão
Fizerem minha morada,
Quero sobre o meu caixão
Os beijos da minha amada.
TROVAS DE AGORA
Vez por outra a inspiração trovista bate à minha porta e os versos libertam-se da cachola, libertários:
Ó doce Mariazinha,
Não tenho prata nem ouro.
Mas, se quiseres ser minha
Tu serás o meu tesouro!
Um belo corpo desnudo!
Em meus sonhos eu te vejo.
Acordo e me desiludo,
Sonho não mata desejo.
Agiu bem o Padre Eterno
Em Seu sagrado mister.
O Éden seria um inferno
Se não tivesse a mulher.
A coisa pior do mundo
É poeta sem paixão.
Versejador vagabundo,
Não vale nem um tostão!
Passou-me em fugaz instante
Por minha mente vadia,
Que essa deusa poderia
Ser a minha eterna amante.
Barros Alves é jornalista e poeta